Quando eu me deixar cair / Cuando yo alguna vez me deje hundir
No sonho de adoecer para poder dormir, / en el cobarde sueño de enfermar
Fere-me com a tua lança! / para poder dormir,
Reaviva em mim a dor, fonte da esperança / hiéreme con tu lanza,
/ Reaviva en mí el dolor, fuente de la esperanza.
Quando a verdade, que é nua / Cuando la verdad desnuda
Me cegar como um sol, e eu me voltar para onde / Me ciegue como un sol
há lua, / y prefiera la luna
E procurar jardins convencionais e plácidos, / mirar desde un jardín convencional y plácido,
Queima-me com teus olhos ácidos! / quémame con tu mirar ácido.
Quando me for mais fácil a verdade do que ter / Cuando más fácil la verdad me sea
Um papel de actor qualquer, / que actuar en la vida de comparsa,
Como aos que assim se recreiam, / como al que con ello se recrea
Faz-me exibir-me bobo ante os que aplaudem ou / hazme ser el payaso de la farsa
pateiam.
Quando eu julgar, falando, dizer, tudo, / Cuando crea decirlo todo hablando,
Faz ante mim sorrir teu lábio mudo! / sonríete ante mí, mudos los labios;
Quando eu me poupe a falar, / y, si por el contrario, me resisto a hablar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar! / aprieta mi garganta y oblígame a gritar.
Quando eu tiver medo do Medo / Cuando sienta del Miedo tanto miedo
E acender fósforos nos cantos rumurosos de / que sólo trate de encender cerillas
segredo / en rincones preñados de silencio.
Arrasta-me pelos cabelos / cógeme por los pelos
Para entre os pesadelos! / y llévame a rastras hacia entre mis pesadillas.
Quando, a meio da noite e da ansiedade, / Cuando en medio de la noche y la ansiedad
Eu me rojar por terra e te pedir piedade / me arroje a tus pies pidiendo piedad,
Não me apareças nem me fales! / a mí no te aparezcas ni me hables,
Deixa-me só com o meu cálix. / déjame a solas apurar mi cáliz.
Quando eu te falsificar, / Cuando hasta a ti quiera falsificarte
E alugar anjos de serrim para em seus braços me / y alquile ángeles de serrín
embalar / para en sus brazos acunarme,
Derrete o chumbo dessas casas: / derrite el plomo de esas casas,
Leva-me no tufão das tuas asas! / que me arrebate el tifón de tus alas.
Quando eu, enfim, não puder mais / Cuando de tan cansado ya no pueda más,
Por tuas próprias mãos belíssimas e leais, / con tus manos bellísimas y leales,
E sem caixões nem mortalhas / sin ataúdes ni mortajas
Enterra-me na terra das batalhas / entiérrame en el campo de batalla.
Quando, depois de morto, a glória / Y, cuando, muerto, me erija la gloria
Me levantar o seu jazigo e celebrar minha vitória, / un monumento y honre mi
victoria,
Desvenda os alçapões dos meus escritos / revela tú las trampas de todos mis escritos,
E arranca à terra que me esconde os mais se / arráncale a la tierra que me esconde
cretos dos meus gritos! / los más secretos de mis gritos.
JOSÉ RÉGIO (1901-1969), As Encruzilhadas de Deus (“Las encrucijadas de Dios”, 1936).
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